Transporte inter-regional de cargas e a concorrência no mercado

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Transporte inter-regional de cargas e a concorrência no mercado

Como já avaliado em publicação anterior (link), o programa de concessões rodoviárias busca suprir parte das necessidades de investimento em infraestrutura de transportes. Em sua nova etapa, o programa inclui tanto a concessão de novos lotes quanto a renegociação de trechos com contratos em fase de término. Grupos antes fora desse negócio, como fundos de investimento e investidores estrangeiros, têm demonstrado interesse nestas oportunidades. O resultado é a configuração de um novo perfil de concorrência no setor. Transformações desta magnitude requerem um enorme esforço de adaptação dos players de mercado já estabelecidos.

Apresentaremos a seguir um conjunto de perguntas norteadoras que as empresas já atuantes precisam responder para identificar potenciais de melhorias, bem como fragilidades fáceis de serem ignoradas.

Analisando primeiramente o setor de concessões na esfera estadual, em 2017/2018 o governo do estado de São Paulo concedeu três importantes lotes de rodovias, dois dos quais atraíram o interesse de operadores experientes e que já possuem outros lotes sob concessão: a rodovia dos calçados, que teve como ganhadora do leilão a Arteris – já concentrada em concessões rodoviárias no Brasil, e controlada por empresa de infraestrutura espanhola; e o trecho norte do Rodoanel, que ficará sob a gestão da Ecorodovias – controlada por empresas de infraestrutura do Brasil e Itália. Já o trecho de Florínea/Igarapava foi leiloado para o Pátria, gestor de recursos privados no Brasil e que está ampliando o portfólio com negócios em infraestrutura, setor imobiliário, crédito, agronegócio e PIPE (private investment in public equity).

Se avaliarmos os programas de concessão da esfera federal, dos projetos de transportes lançados dentro do PPI (Programa de Parcerias de Investimentos), apenas uma parte já foi transferida à iniciativa privada, principalmente nos setores de aeroportos e portos. As concessões rodoviárias federais, por sua vez, têm uma relação extensa de projetos para serem leiloados em 2018 (listados na tabela abaixo). Mesmo que apenas uma parte dessas rodovias siga o cronograma de leilões previsto, a pergunta que fica é: devemos esperar um perfil de empresas experientes nos leilões, ou novos grupos em busca de ampliação de portfólio, como ocorreu nas concessões do estado de São Paulo?

Como os investidores estrangeiros estão avaliando esses negócios? As empresas chinesas, por exemplo, já possuem US$ 117 bilhões em investimentos diretos acumulados no Brasil, segundo o Ministério do Planejamento, e atualmente a maior concentração está três setores: energia, mineração e agronegócio. Para 2018 espera-se que as empresas chinesas busquem avanços em projetos de infraestrutura novos. E de acordo com reportagem recente publicada no jornal Valor Econômico (link), o Fundo Brasil-China para a expansão da capacidade produtiva, que foi lançado recentemente, tem até US$ 20 bilhões disponíveis e deve dar uma mãozinha. Autoridades dos dois países já se reuniram em Brasília e estão avaliando conjuntamente oito projetos pré-selecionados para inaugurar o mecanismo de apoio bilateral.

A questão central que se coloca é, então: como as concessionárias com contratos vigentes podem se preparar?

 

Estratégias competitivas

Para responder a esta pergunta tentaremos explorar como os novos concorrentes podem atrair maiores fluxos de transporte para suas rodovias e, assim, ampliar os resultados vis-à-vis empresas já atuantes no mercado. Para tanto, faremos um estudo de caso de concessão federal versus estadual, comparando a atratividade de ambas para o transporte inter-regional de cargas.

As matrizes de origem-destino são uma das principais fontes de informação para o transporte de cargas no Brasil. Um dos pares mais relevantes é o fluxo do trecho São Paulo <–> Rio de Janeiro, que corresponde a um volume de carga geral transportada de mais de 1,8 milhão de toneladas por ano. As principais vias nesse trecho são as rodovias Dutra (ou BR 116), sob concessão federal, e a Ayrton Senna/Carvalho Pinto (ou SP 070), sob concessão estadual.

Do ponto de vista da transportadora, é necessário fazer uma análise de custo-benefício antes de decidir por onde trafegar. Em termos de custo para a transportadora, ambas as rodovias geram gastos similares com pedágio no trecho em que são paralelas. Nas 3 praças de pedágio da Dutra o custo total é ligeiramente superior, de R$ 13,30; enquanto nas 4 praças de pedágio da Ayrton Senna/Carvalho Pinto o custo total é de R$ 13,00. Na avaliação qualitativa dessas rodovias, por sua vez, feita pela pesquisa CNT, a Ayrton Senna/Carvalho Pinto (11ª colocada no ranking de melhores rodovias) possui melhor avaliação do que a Dutra (19ª colocada).

Mas os veículos de carga ainda optam com mais frequência por trafegar pela rodovia sob concessão federal, a Dutra. Por quê? A Dutra se destaca pela quantidade de oficinas, postos, lanchonetes e restaurantes com estrutura para recepcionar o caminhoneiro, atraindo maior tráfego e receita de pedágio para essa rodovia. Esses postos, portanto, se transformaram em uma vantagem estratégica para uma rodovia, que teoricamente perderia em uma análise simples de custo-benefício feita pela transportadora. Isso inclusive está sendo revisado em alguns contratos de concessão vigentes, como o do Rodoanel, por exemplo.

Combinando a análise feita acima com a que fizemos na publicação anterior (link), em que avaliamos a concorrência dos modais alternativos já existentes, concluímos que o esforço de planejamento estratégico deve considerar as várias dimensões do mercado e da operação, incluindo elementos qualitativos que podem ser ignorados em análises estritamente quantitativas.

Além dos desafios já existentes, o setor de transporte inter-regional está passando por mudanças importantes que podem alterar de forma significativa a interação dos players neste mercado. Por isso, a identificação de tendências e relacionamentos do transporte rodoviário de cargas com outros modais e outros players mostra-se fator fundamental para aqueles que querem se antever aos movimentos de mercado de ampliar os resultados.

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